Fábio Adiron
Quem é da minha geração, um pouco mais ou um pouco menos, e estudou marketing, administração, economia e afins, aprendeu a respeito de precificação com o clássico de Richard Leftwich, “O sistema de preços e alocação de recursos”, publicado originalmente na década de 70.
O livro apresentava desde os conceitos mais básicos de formação de preços até seus impactos financeiros e econômicos nas corporações, não só de como isso afetava os planos orçamentários correntes, como também os seus investimentos.
Cinquenta anos depois e apesar de muitos terem passado pelas lições de Leftwich, ainda temos muitos negócios funcionando na base de “preço é custo mais margem desejada” ou “preço é o que consumidor está disposto a pagar”. Nenhuma dessas frases está essencialmente errada mas estão longe de aproveitar toda a sofisticação onde as técnicas de precificação chegaram.
O problema, aparentemente, é que as pessoas (salvo algumas aves raras especializadas em precificação) não são seduzidas pelo tema como são para as modas do momento.
É mais divertido elucubrar sobre o novo normal do que entender a elasticidade de preços dos seus produtos. Acompanhar o boom da mais recente rede social é infinitamente mais divertido do que analisar sua gestão de rendimentos.
A elasticidade não pode ser desprezada
Consumidores podem, ou não, ser sensíveis a preços. Para alguns produtos e serviços a variação do preço final pode ser dramática, especialmente se forem considerados produtos não essenciais.
A elasticidade é inversamente proporcional a isso. Quanto mais essencial for o produto, menos elasticidade ele tem. Quanto menos essencial, mais elástico.
A outra variável que afeta a elasticidade é a comoditização do produto, de forma direta, nesse caso. Quanto mais comoditizado mais elástico.
O aumento pode representar uma drástica queda de consumo. A redução pode ser um estímulo à compra. A primeira coisa que você precisa ter clareza em gestão de preços é o nível de elasticidade dos seus produtos (que variam de totalmente elásticos a totalmente inelásticos).
Não é o único fator que influencia a decisão de compra. Mas é um fator muito importante.[1]
Segundo Jill Avery, palestrante da Harvard Business School, existem alguns erros comuns na gestão de elasticidade de preços:
Percepção de preço
Se você trabalha no varejo, sabe identificar categorias chave e produtos chave do seu negócio. São aquelas categorias ou produtos cujos preços os consumidores costumam reparar e lembrar.
Se você não trabalha no varejo não tem problema, esse fenômeno é muito parecido em outros mercados.
O que não significa que quem conhece as categorias e produtos chave tenha um processo sistemático e baseado em dados para determinar quais são e que preço podem ter.
Normalmente se compara aos concorrentes, aos atacadistas. Estima-se a frequência de compra dos produtos. E decidem pela intuição.
Considerando um mundo que está repleto de dados transacionais (além do dilúvio de big data) é possível analisar quase infinitas transações e aproveitar os recursos analíticos para melhorar a percepção de preço.
Entender os itens considerados de melhor custo/benefício (e os clientes que os compram), os clientes mais sensíveis a preço, os produtos menos comprados, os produtos mais pesquisados e, claro, os produtos caros que são comprados regularmente, são algumas das possíveis análises disponíveis.[2]
A implementação de uma metodologia não demanda investimentos em novas tecnologias (os dados já estão dentro de casa), nem um exército de analistas de dados, a maioria das empresas não precisa de mais do que um analista para gerar esses insights e melhorar os resultados.
Gestão de preço significa aumento de lucro
A forma mais rápida e mais eficaz para uma empresa atingir sua capacidade máxima de lucros é aplicando preços certos, muito mais do que aumentando volume de vendas.
O contrário também é verdadeiro, preço errado é a melhor maneira de corroer toda a sua lucratividade, por melhor que seja o desempenho da área comercial.
Em um longo estudo de casos reais feito por consultores da McKinsey demonstrava que um aumento de volume de 1% (sem mudar preços) melhorava a margem em 3,3%. Se o aumento fosse de 1% no preço (sem mudar o volume), a margem líquida aumentava em 11,1%, praticamente três vezes e meia mais. Em outro exemplo, mostram que o aumento de 2,5% nos preços de uma empresa de produtos de consumo durável representou um aumento de 30% nos lucros.[3]
Não estamos falando de aumentos brutais de preço, que ocorrem com frequência nas nossas plagas, mas de minúsculos incrementos de preço ao consumidor final.
Analisando o preço final
O americanos se referem ao preço ao consumidor final como pocket price. Duas formas de analisá-lo mostram o caminho para encontrar esse 1% adicional.
A primeira é a de entender a jornada do preço, chamada de pocket price waterfall. À medida que começamos a olhar todas as etapas do preço começamos a descobrir muitos momentos em que abrimos buracos no bolso dos lucros: bônus por volume, descontos para pagamento à vista, custos de consignação, descontos online, fretes, promoções, e por aí vamos.
De novo. Não significa acabar com todo o processo promocional do seu produto, mas de encontrar etapas onde você está sendo mais permissivo do que deveria. Inclusive porque isso pode permitir que você mantenha o preço final inalterado.
Você pode estar pensando, mas isso é gestão de custos. De certa forma sim, mas a maioria dos negócios não contabilizam essas contas como tal.
Gestão da banda larga
Outro ponto relevante é que você não precisa aplicar todas suas reduções em alguma etapa do waterfall de forma indiscriminada. Você pode ter preços diferentes em mercados diferentes e em situações competitivas desiguais.
Operar dentro de uma banda larga de preço final não é necessariamente ruim. Pelo contrário, quando você fizer algum ajuste de preço, para cima ou para baixo, vai ter menos impacto do que se sua faixa de preços for muito estreita e qualquer movimento é percebido pelo mercado.
Com uma boa análise do waterfall e espaço para manobrar os preços, você pode rapidamente encontrar o seu 1%. [4]
Gestão de pacotes
É comum muitas empresas “empacotarem” produtos e serviços em uma única oferta final a um preço competitivo para os consumidores.
Quando esses produtos são vendidos isoladamente eles podem ter custos e margens muito díspares (e normalmente têm), mas são comercializados com uma margem fixa sobre o custo total.
Não precisa ser assim. Vai dar um pouco mais de trabalho, mas você pode empacotar sua oferta trabalhando com margens diferentes em muitos ou mesmo todos os produtos. O impacto no preço final não vai ser relevante e, muito provavelmente, continuará competitivo.
Domando a fera
O jogo de transações dentro de uma empresa pode ser ganho ou perdido por uma série de decisões individuais de negociações. Poucas empresas estão preparadas para acompanhar essas perdas e acabam no fundo da cachoeira. Afogadas.
Alegar as dificuldades para juntar esses dados não serve como desculpa. Dados são uma vantagem competitiva. Recursos tecnológicos estão à disposição de todos. O desenvolvimento de habilidades para usá-los também.
Em um sistema econômico e de mercado cada dia mais complexo, a gestão de preços é ainda mais crucial para garantir os resultados.
[1] GALLO, Amy. A refresher on price elasticity. Harvard Business Review. 2015
[2] HEINRICH, Oliver, MUSSA, Alberto, ZERBI, Stefano. How retailers can improve price perception – profitably. McKinsey & Company. 2016
[3] MARN, Michael V., ROSIELLO, Robert L. Managing price, gaining profit. Harvard Business Review. 1992
[4] MARN, Michael V., ROEGNER, Eric V., ZAWADA, Craig C. The power of pricing. McKinsey & Company. 2003